Às vezes eu me pego pensando naqueles dias que marcam a nossa vida como uma espécie de marco temporal. Aqueles dias em que uma decisão, um caminho, uma descoberta acabaram se tornando fundamentais para as mudanças de rumo em nossas vidas. Claro que em sentido pessoal, a gente só percebe o valor dessas decisões muito tempo depois.
Bem, com a história da ciência não é muito diferente. Quando alguém publica um artigo científico, não dá para predizer o peso que ele trará para as futuras pesquisas e nem a sua influência para os conhecimentos da ciência. Exceções, claro, existem por aí. Mas o caminho natural para uma pesquisa ser alçada como marco histórico é árduo.
Quando Albert Einstein publicou, em 1905, os quatro artigos científicos que mudaram a história da Física, ele até poderia ter noção do impacto de suas teorias. Mas ele não foi imediato; a comunidade científica ainda teve certo ceticismo com a descrição do movimento browniano [1] e com a teoria da relatividade restrita proposta pelo cientista alemão [2], além do espanto com a explicação do efeito fotoelétrico e da relação entre massa e energia que deu origem a uma das mais conhecidas expressões matemáticas [3] da Física: o E = mc².
Fato é que os desdobramentos dos artigos publicados por Einstein naquele annus mirabilis revolucionaram a Física. A concepção de que o tempo é relativo ao observador nos permitiu, anos mais tarde, pôr em funcionamento o sistema de GPS que hoje permite que você vá a qualquer lugar do mundo com uma conexão com a internet, um smartphone e boa vontade. O efeito fotoelétrico está em todos os lugares: dos sensores de presença ao controle de luminosidade da tela de seu telefone celular.
Hoje sabemos o quanto 1905 foi um ano importante para a Física. Cem anos depois do miraculoso ano de Einstein, a Unesco promulgou 2005 como “ano internacional da Física”. E em 2024, 119 anos depois daquele ano em que Einstein modificou para sempre nossas concepções sobre tempo, espaço e moléculas, o governo brasileiro instituiu oficialmente o Dia Nacional do Físico a ser comemorado todo dia 19 de maio (referência maravilhosa a 1905, não?).
Então, a partir deste ano, oficialmente somos lembrados em uma data nacional. Um dia teremos um feriado em nossa homenagem. Mas, por enquanto, eu me contento em ser lembrado no dia 19 de maio. Chocolates ajudam. A regulamentação da profissão, como a instituição do conselho federal da profissão, aprovada em lei em 2018, também.
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[1] A descrição do movimento browniano proposta por Einstein foi importantíssima para a própria concepção do átomo ser pesquisada, como vimos aqui: https://ccult.org/o-que-e-menor-do-que-aquilo-que-nao-podemos-ver-o-caminho-ate-a-confirmacao-da-existencia-dos-atomos/
[2] Como você sabe, Einstein propôs duas teorias da relatividade: a restrita, que essencialmente propõe que a velocidade da luz é sempre a mesma, independentemente do referencial adotado (o que torna o tempo relativo, pois a velocidade da luz é finita) e a geral, que descreve, em linhas gerais, o comportamento da gravidade a partir da ideia de distorção espaço-tempo. A própria distorção do espaço provocada por uma massa era algo que Einstein considerava absurda e, para a sorte do conhecimento, um cientista é autor de sua ideia, mas não é o dono: coube a outro cientista alemão mostrar que Einstein estava correto em sua análise, mas errado em sua ideia de coisas impossíveis em uma das histórias mais incríveis da história da ciência: https://ccult.org/schwarzschild-guerra-e-a-relatividade-geral/
[3] Chamar as expressões matemáticas de “fórmulas” é o Efeito Datena socialmente aceitável.
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