É fato que a pandemia de COVID-19 forçou a entrada de inovações tecnológicas no ensino de ciências. A sala de aula virou um meeting virtual, a lousa passou a ser escrita digitalmente e os celulares, de vilões cuja permanência era proibida dentro das salas de aula convencionais, tornou-se item de primeira necessidade para mitigar os efeitos que o absolutamente necessário isolamento social teve na educação.
O repertório de possibilidades de uso das tecnologias digitais no ensino é imenso, como já apresentado aqui. Você pode visitar museus, ir para Marte ou para a Lua, ou até mesmo fazer simulações virtuais utilizando computadores, tablets ou telefones celulares.
Mas é possível ir além. Imagine, por exemplo, conseguir visualizar as linhas de campo magnético de um ímã em três dimensões, com cores e orientação espacial direto da tela de seu telefone celular. Ou imagine mostrar as estruturas de células com animações que podem ser captadas por todos os alunos a partir de seus smartphones. Ou ainda, mostrar partes da anatomia humana com poucos toques na tela.

Tudo isso (e mais um pouco) é oferecido pela realidade aumentada. No cotidiano, a realidade aumentada — ou RA — já está em franco uso na publicidade, como nas embalagens de cerais matinais (você sabe o nome, certo?), em aplicativos de decoração e de design interior (como aqueles que permitem o usuário visualizar como ficaria o ambiente com a nova disposição de móveis, por exemplo) e em sites de vídeos (como o YouTube e o Vimeo) e em jogos, como Pokemon Go (vai dizer que você nunca caçou Pokemons por aí?) e em museus, que oferecem esse recurso como forma de melhorar a apresentação de informações sobre as exposições. Graças a realidade aumentada, é possível interagir com as imagens produzidas sem, necessariamente, o auxílio de óculos 3D ou de realidade virtual – aqueles que permitem a imersão total em uma realidade virtual, como um carrinho de montanha-russa —; com isso, basta o uso de um smartphone e pronto: a realidade aumentada está diante de seus olhos.
No ensino de ciências, há bons indicadores de que o uso de RA potencialize o aprendizado e a formação conceitual dos alunos e o engajamento deles durante as aulas que utilizem este recurso.
A base do funcionamento da realidade aumentada
Diferentemente da realidade virtual — RV para os íntimos—, a realidade aumentada não substitui o ambiente ao redor, mas sim, acrescenta informações ao que é visualizado .
Entretanto, produzir realidade virtual não é das coisas mais simples do mundo. Primeiro é preciso definir o tipo de realidade aumentada: visão óptica direta, visão direta por vídeo, visão por projeção e visão baseada em monitor — que é a que permite a captação de imagens e a RA na tela do celular, por exemplo. Depois, é preciso construir o algoritmo e os mecanismos conversão para que a realidade aumentada apareça de forma correta. Dá para saber mais sobre esse processo aqui e aqui .
No fim das contas, o algoritmo identifica algum marcador, como um QR-Code ou as informações de localização de seu telefone, e determina a localização do objeto para que você possa visualizá-la em três dimensões, em qualquer ambiente:
Em geral, adotam-se cartões como o da imagem abaixo como marcadores que farão a geração das imagens em realidade aumentada:

A realidade aumentada no ensino de ciências
Ótimo, e como acessar essas imagens produzidas em realidade aumentada? Uma das possibilidades é a busca do Google. Ao acessar o sistema de buscas a partir de um aparelho — cuja lista de compatibilidade você pode consultar neste endereço — com Android 7.0 ou superior (ou com um iOS a partir do 11.0) e digitar o nome de determinadas espécies, da anatomia humana ou de personalidades, por exemplo, como o primeiro ser humano a pisar na Lua, o sistema de buscas apresenta os resultados tradicionais e um ícone para a acessar a realidade aumentada.
A lista completa de itens que podem ser visualizados em realidade aumentada a partir do buscador pode ser conferida neste endereço .
Outra solução é o uso de aplicativos proprietários desenvolvidos por empresas ou universidades e seus programas de pesquisa em educação. Infelizmente, a imensa maioria desses aplicativos ou é paga ou ainda não foi traduzida para a língua portuguesa. O PhET, velho conhecido dos usuários de simuladores virtuais, oferece algumas de seus laboratórios em RA também com acesso a partir de smartphones. Há também aplicativos de apoio aos estudos com realidade aumentada que você pode conferir aqui .
Uma das coisas mais legais da RA no ensino de ciências é possibilitar a mudança da visão 2D das lousas para o 3D do mundo real (tá, virtual também). E isso resulta na melhor visualização e representação conceitual dos estudantes. Veja a imagem a seguir:

Fica nítido perceber como os alunos desenham com mais detalhes o campo magnético de um ímã após terem contato com uma simulação em RA do campo, especialmente quando comparamos os resultados obtidos a partir do livro (A), das limalhas de ferro (B) e da representação em realidade aumentada (C).
E as aulas de campo? Também podem ser complementadas pela RA! Com aplicativos de clip drop como este , é possível fotografar um objeto, uma planta, um animal e transportá-lo para a realidade aumentada, possibilitando a troca de informações, estudo de detalhes e discussões individuais ou em grupos. Embora aplicativos que façam uso dessa tecnologia de “extração e cópia” tenham funcionalidades gratuitas limitadas, é uma boa alternativa, mesmo em aulas remotas.
O uso da realidade aumentada ainda engatinha. Mas se por um lado, as tecnologias digitais estão irremediavelmente imersas em nosso cotidiano, podemos tirar proveito delas. Os smartphones estão acessíveis em quase todos os momentos de nossa vida. Por que não nos aliarmos a isso e trazê-lo para melhorar nossas práticas e provocar a reflexão sobre o seu uso?
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Para saber mais:
- BUESING, M.; COOK, M. Augmented Reality Comes to Physics. The Physics Teacher, v. 51, N.4, 226. Disponível em: https://aapt.scitation.org/doi/10.1119/1.4795365
- Texto publicado na Scientific American sobre o emprego da RA [em inglês]: https://www.scientificamerican.com/article/augmented-reality-is-getting-real/
- BUCHAU, A; RUCKER, W. M. Augmented reality in teachingof electrodynamics. COMPEL International Journal of Computations and Mathematics in Electrical. v. 28, p.948-963. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/216813296_Augmented_reality_in_teaching_of_electrodynamics
- Como funciona a realidade aumentada [em inglês]: https://www.fi.edu/science-of-augmented-reality
- Possibilidades de uso da RA no ensino de ciências [em inglês]: https://education.nsw.gov.au/teaching-and-learning/professional-learning/scan/past-issues/vol-39-2020/getting-real–learning-with–and-about–augmented-reality
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F. C. Gonçalves é mestre em ciências pela Escola de Engenharia de Lorena (EEL-USP) desde 2019, além de licenciado em Física pela Universidade de Taubaté (Unitau) desde 2010, mesmo ano em que passou a atuar no ensino de Física nos níveis fundamental e médio. Como não sabe desenhar nem tocar nenhum instrumento musical, tampouco possui habilidades para construir qualquer tipo de artesanato, restou-lhe a escrita: “quando não sei o que dizer, escrevo”, diz. Desde criança é entusiasta do conhecimento científico. Da sede de querer conhecer mais sobre o mundo veio a paixão pela Astronomia. E quando menos percebeu, estava escrevendo e falando sobre o conhecimento científico para quem quisesse ler ou ouvir.
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